A Trasladação de São Bento: A Jornada Sagrada que Deu Origem à Sua Festa em 11 de Julho

Em meio às colinas do Lácio, São Bento de Núrsia encerrou sua missão terrena no mosteiro de Monte Cassino por volta do ano 547. Foi ali que, após uma vida marcada pela oração, pelo silêncio e pela sabedoria da Regra, ele foi sepultado ao lado de sua irmã, Santa Escolástica. O local de repouso de ambos tornou-se, por séculos, centro de veneração e berço da espiritualidade beneditina.

Contudo, a festa de São Bento que celebramos anualmente em 11 de julho não está relacionada diretamente com seu falecimento, mas sim com um evento que ecoou profundamente na história da Igreja e da Europa: a trasladação de suas relíquias para a França.

Um contexto de instabilidade e fé

Durante o século VII, a Itália enfrentava constantes invasões — sobretudo dos lombardos — que afetaram severamente os mosteiros, inclusive Monte Cassino, que foi parcialmente destruído e temporariamente abandonado. Diante disso, e temendo que as relíquias do santo fossem profanadas ou perdidas, monges do Mosteiro de Fleury-sur-Loire, na Gália (França), decidiram agir.

Sob a liderança do monge Aigulf, e com autorização do abade Mummolus, os monges franceses empreenderam uma viagem ousada até a Itália. Lá, segundo as crônicas preservadas, descobriram o túmulo de São Bento e Santa Escolástica, e com reverência, transportaram seus restos mortais para o mosteiro de Fleury, onde chegaram por volta do ano 703 d.C.

Relíquias que evangelizam

A chegada das relíquias a Fleury foi marcada por grande solenidade e, segundo os relatos, também por sinais prodigiosos, como milagres de cura, conversões e manifestações de graças especiais. A veneração cresceu intensamente e transformou Fleury em um dos principais centros beneditinos da Europa medieval.

A trasladação teve impacto tão forte que sua data litúrgica foi fixada em 11 de julho, tornando-se uma das festas mais celebradas da Ordem Beneditina e, mais tarde, a principal solenidade de São Bento no calendário romano, especialmente porque a data de sua morte (21 de março) coincide com a Quaresma e nem sempre pode ser celebrada com festa.

Uma controvérsia santa

Essa transferência, no entanto, não passou sem resistência. Monges italianos e outras fontes questionaram se as relíquias levadas eram, de fato, autênticas. Monte Cassino permaneceu, até hoje, defendendo que conserva os verdadeiros restos de São Bento. Apesar da disputa, a tradição litúrgica e monástica ocidental reconheceu a validade espiritual da trasladação, e a devoção a São Bento floresceu ainda mais através dela.

É importante notar que, na Idade Média, trasladações de relíquias eram vistas não como roubo, mas como ação providencial, muitas vezes interpretadas como vontade do próprio santo. Assim, a transferência das relíquias de São Bento foi entendida como sinal de que ele queria ampliar sua missão e presença espiritual também fora da Itália.

Uma festa que unifica a Europa

Em 1964, o Papa São Paulo VI proclamou São Bento Padroeiro Principal da Europa, reconhecendo não só sua influência espiritual, mas também cultural e civilizadora. Esse título reforçou a celebração do dia 11 de julho como festa oficial no calendário litúrgico romano, tornando-se um ponto de união entre as nações e tradições que compartilham a herança beneditina.

Um legado eterno

Celebrar São Bento em 11 de julho é lembrar que Deus não permite que a luz dos santos se apague com a morte. A trasladação de suas relíquias, longe de ser apenas um deslocamento físico, foi um gesto providencial: ele, que tanto influenciou a construção da civilização cristã, continuaria a caminhar com o povo de Deus pelos caminhos da história.

Que essa festa nos inspire a seguir seu exemplo de escuta, de silêncio fecundo, de obediência a Deus e de busca incessante pelo Reino, onde quer que estejamos.

Ut in omnibus glorificetur Deus – Para que em tudo Deus seja glorificado.